Uma última valsa...

Foram anos a percorrer o teu corpo com o meu sopro que acariciava a tua cara.
Encontrei o ouro e até as estrelas quando de um passar de mão hábil e subtil limpava as tuas lágrimas.
Aprendi de cor a pureza das tuas formas para que mais tarde pudesse pintá-las na minha matéria cinzenta, onde a conexão entre os meus neurónios possam gritar o teu nome. Para que esse pedaço do teu “tu” conectara ao meu “eu”.
Conheci-a cedo demais porém, a culpa não é minha… Esta flecha atravessou a minha pele e essa dor guardo-a porque ela estimula em mim um prazer inacabado. Infelizmente já conheço essa nossa história, li no teu olhar acastanhado uma viagem em preparação; viagem com origem no meu coração mas como destino, outra alma carente que não resistiu ao teu charme sólido e que também não me deixou indiferente. Por isso decidi falecer espiritualmente porque o tempo não pode voltar atrás, e penso, que recebi das tuas mãos uma felicidade passageira que passou numa viagem expresso na corrente sanguínea das minhas veias, que ligam o meu coração para que de uma batida possa dar um passo nessa solidão amorosa que é a minha. É difícil por um só homem vê-la fugir sem pronunciar um “fica”, simplesmente murmurei um “amo-te” como se murmura um “vai-te embora”.
Só quero partilhar o teu ar mais uma vez para te agradecer de ter maravilhado a minha vida e peço te uma última dança, antes que a sombra e a indiferença caia numa vertigem silenciosa. Lembra-me de me inspirar em ti, das noites, das auroras, das minhas derivas lúcidas, dos dias em que as ruas exsudarem o vazio das cidades do meu corpo, dos meus desejos recalcados na viagem vertiginosa dos sonhos implícitos que me atiram apreste de 9 milímetro na minha alma.
Penso que a tua raiva também é a minha, é idêntica ao dourado solar que enrubesça no meu rio, a minha esfera, as minhas correntes que picotam a minha pele num vermelho sanguíneo. Os nossos corpos nunca mais vão poder tocar-se porque a raiva brinca a dar a volta no coração dos átomos que em conjunto dá vida ao “ nós”, a corpos autónomos e arraçoados onde a esperança é corroída por um vírus chamado “AMOR” transformando-nos em seres melodramáticos.
Tremo e pondero,
Fico e analiso.
Uma ruga no espelho, estou a ficar velho, vejo ao lado a minha cama que tem lugar por nós os dois, mas a tua ausência exalta uma tristeza em mim porque antes que a minha vida passa quero guardar a tua imagem ao meu lado nesta cama comigo. Esta ruga põe-me a pensar na verdadeira questão amorosa... Será que fomos felizes?? mas por enquanto a luz do meu quarto vazio apaga-se pouco a pouco e antes de estar rodeado no escuro que guardar a esperança de um possível regresso teu.
Último aviso de tempestade,
último refrão,
viver sem pensar no amanhã,
dançar até fazer girar a Terra,
descer na era do " será que nunca fomos felizes"???.
Último cigarro, acompanhado por um copo de whisky,
quero beber e fumar para festejar a tua perda antes que começo a correr no pântano da infelicidade.
Quero dançar, e revelar sempre a minha alma na desgraça desse espelho, continuar essa nossa última valsa nesta decoração mórbida do meu quarto que está nu de fotos tuas, nu de roupas tuas e nua de nós....
Se eu me esquecer de ti dou a minha vida, a minha sombra, para que desta soma, o resultado dê certo para a problemática do esquecimento… do meu esquecimento…